Ferrovias para Brasília - 1934
Uma carta do engenheiro
Monteiro Bastos
A Mudança da Capital Federal: Trabalhos ferroviários e rodoviários
para a ligação
de Goiás com o litoral e os Estados de Minas, S. Paulo e Rio
O Globo, 12 de março de 1934, p. 6
[cf. AH2:258-260]
(...)
À primeira vista tem-se a impressão
de que, com a saída do projeto da mudança [da
capital do Brasil] para Goiás do plano da publicidade, nada
se teria feito para o encaminhamento da solução do problema.
Ora, a verdade é que têm
sido realizadas várias obras de caráter ferroviário
e rodoviário, para que se atinja uma das soluções desse problema
que condiz com a ligação do distrito federal goiano com o litoral
e os Estados de Minas, São Paulo e Rio de Janeiro.
É do que já está sendo feito nesse sentido
a seguinte carta do Dr. Archimedes M. Monteiro Bastos, engenheiro da Estrada de
Ferro Oeste de Minas:
"Sr. Redator do Globo. — Com relação
à nota publicada há dias por este brilhante jornal sobre a mudança
da capital para o planalto central, seja-me permitido dizer-vos o seguinte: A
implantação da Capital Federal no Planalto Central é
um projeto em plena execução, podendo-se mesmo afirmar que
a terceira das três etapas — escolha do local, caminho de acesso e de serviço,
plano e construção — por que se estende a sua solução,
já foi atingida. A velha República, a despeito de sua morosidade,
erros e vícios, encaminhou para aquela região
privilegiada do país nada menos de três importantes
ferrovias e não deixou que se passasse o centenário da independência
do Brasil sem que um marco falasse a toda a gente que era ali [que] se ia levantar
a Capital.
A estrada
de ferro Goiás diretamente ligada às ferrovias
de São Paulo já atingiu a região do planalto,
estando a sua estação de Ponte Funda ligada por
uma rodovia de 40 km ao marco
de fundação da nova cidade [na
verdade: 160 km em linha reta], plantado pelo engenheiro
Balduino de Almeida, seu então diretor, por ordem do governo
Epitácio Pessoa. Significa isso que já
existe transporte para a nova capital.
A EF Oeste de Minas já tem em pleno tráfego longo trecho de outro
caminho para o planalto — a sua linha
tronco de Angra dos Reis, porto de mar já aparelhado e explorado pelo
Estado do Rio, no km 1, à cidade Patrocínio, no km 901, e está
ultimando a ligação deixada em meia execução pela
antiga Companhia EF de Goiás, de Patrocínio
a Ouvidor, em Goiás, no Ramal Catalão. Em 1928, pensando nas
vantagens desse caminho direto sem entraves das bitolas, propriedade e administração
diferentes, lembrei a criação da EF Oeste
do Brasil, fusão dos EF de Goiás e Oeste de Minas, ambas
de propriedade e então diretamente administradas pela União, dando
dessa forma vida ao velho plano de Paulo Cândido [sic],
lançado em 1851. A EF Oeste do Brasil, assim conhecida, seria o verdadeiro
caminho de serviço para a nova capital já fundada e que aguarda
apenas um brasileiro que mande construí-la.
A EF Central do Brasil, a terceira ferrovia rumando para o planalto, apenas
transpôs o médio S. Francisco em Pirapora
– Independência, que distam dele nada menos de 400 km.
Como vedes, Sr. Redador, já caminhamos bastante no sentido da capital
no planalto. O retrocesso equivale ao abandono de um plano
em vias de acabamento, o que tem sido funesto ao desenvolvimento do Brasil.
A simples proteção dos capitais empregados nessas ferrovias indica
que devemos marchar para a frente. As populações da linha avançada
da civilização do oeste-noroeste de S. Paulo, Triângulo Mineiro,
sul, centro e norte de Goiás, oeste da Bahia, noroeste de Minas — e demais
regiões vizinhas, outra aspiração não acalentam senão
banhar-se à luz da grande capital colocada nos cimos de Altamir.
Deslocar a capital para o litoral é atentar contra o futuro do Brasil
já tão comprometido pelos excessos de "estadualismo"
desenfreado e anti-patriótico. Se algum deslocamento se projeta
— que não transponha as águas do gigantesco Paranaíba e se
detenha naquela curva dos confins de Goiás com Minas, no município
goiano de Catalão onde vai ter a nova linha de Ouvidor. Altitude ótima
de 900 e tantos metros, terrenos ondulados e férteis, proximidade de quedas
d'água de vulto, materiais de construção, águas puríssimas,
entradas e saídas fáceis para todos os lados — eis as condições
apenas superadas no planalto.
É um engano supor-se que se trata de regiões desertas. Um rápido
olhar pelo mapa moderno da região percebe logo o brilho das prósperas
cidades e localidades que constituem o diadema da futura capital.
O automóvel e o avião completam o sistema de transportes fáceis
para tão importante zona.
Junto tendes um mapa que não é muito preciso — serve, porém,
para uma idéia de conjunto.
Aí tendes, Sr. Redator. Barra Mansa, 20-2-34.
Com meus agradecimentos pela atenção que merecer, sou um assíduo
leitor.
Archimedes Bastos, engenheiro civil e de minas (da EF. Oeste de Minas).
|
|
|