Relatório Cruls, 1896
Ofício ao Ministro
Ofício de Luís Cruls ao ministro da Viação,
in Comissão de Estudos da Nova Capital da União. Relatório
Parcial,
Rio de Janeiro, 1896, p. III
cf. AH1:306-307
Sr. Ministro,
Ao apresentar-vos o Relatório parcial dos trabalhos realizados
por esta comissão, desde o mês de julho de 1894 até
fins do ano de 1895, seja-me permitido submeter à vossa criteriosa
apreciação as seguintes considerações.
Os trabalhos que estão afetos a esta comissão, sendo
por sua natureza extremamente complexos e de não pequena
responsabilidade, visto que prendem-se a um assunto de que trata
a Constituição da República, considero de meu
rigoroso dever informar-vos que a boa execução de
semelhantes trabalhos depende essencialmente de um plano convenientemente
elaborado, ao qual eles devem obedecer. Este plano, porém,
não deve sofrer alterações sensíveis,
nem tão pouco interrupções, sob pena de se
tornarem os trabalhos não só mais dispendiosos como
menos perfeitos. Nada mais prejudicial, como sabeis, do que uma
interrupção em trabalhos como estes de que está
incumbida esta comissão, não só sob o ponto
de vista econômico como técnico.
Para evitar esse inconveniente, torna-se indispensável que o Congresso
Nacional, tomando em consideração os altos interesses que se ligam
ao cumprimento do art. 3º da Constituição, não deixe
de conceder anualmente os créditos necessários para o regular andamento
não só dos estudos da nova capital, como também da estrada
de ferro de Catalão a Cuiabá. Com efeito, a mudança
da capital da União só poder-se-á tornar uma realidade depois
de construída a parte desta estrada que une a cidade de Catalão
ao ponto escolhido para a mesma capital, por meio de um ramal, de acordo com as
nossas Instruções de 1 de junho de 1894.
Tenho a mais absoluta convicção de que da mudança
da capital, a par dos interesses políticos que a ela se prendem,
resultará para o Brasil, sua prosperidade e desenvolvimento
futuro, as mais benéficas conseqüências, que atualmente
ninguém pode avaliar.
O empreendimento, conquanto de difícil realização, não
deixa de ser exeqüível, e pode sê-lo em tempo relativamente
curto, o que depende exclusivamente da existência de uma via férrea.
Ora, duas estradas estão atualmente convergindo para a cidade de Catalão,
a Mogiana e a Oeste de
Minas, e aí poderão chegar os trilhos dentro de muito pouco
tempo. Se, ao mesmo tempo, o governo fizer ativar o mais possível os estudos,
e a construção da estrada estratégica
de Catalão, Goiás, Cuiabá, com ramal para o planalto,
o trecho desta estrada a construir entre Catalão e a nova capital terá
um desenvolvimento que não excederá muito de 450 quilômetros.
Melhores condições, sob o ponto de vista do menor desenvolvimento,
apresentará a estrada de Catalão a Palmas,
cujo traçado atravessa a zona demarcada, encurtando ainda mais o traçado
e tornando até desnecessária a construção de um ramal,
destinado a ligar a futura capital com a estrada de Catalão a Goiás,
uma vez que se realizar a construção da estrada de Catalão
a Palmas.
Por aí vedes, sr. Ministro, que a ligação, por meio de
uma via férrea, entre a atual e a futura capital, é questão
de poucos anos, embora o aproveitamento das atuais estradas de ferro, já
existentes, tenha o grande inconveniente de alongar consideravelmente o desenvolvimento
total do traçado; mas em todo o caso, é a única solução
que, por ora, se impõe, até
que, um dia, seja levado adiante o projeto de uma estrada
de ferro de traçado direto, idéia que já apresentei
no «Relatório da Comissão
Exploradora do Planalto Central», e aliás perfeitamente realizável,
ainda que de execução onerosa.
Antes de terminar estas ligeiras considerações, sr.
Ministro, não posso deixar de declarar o quanto é
lastimável não ter o Congresso Nacional concedido
a necessária verba para continuação dos nossos
trabalhos, durante o exercício vigente.
Seria muito para desejar que o Congresso Nacional manifestasse
de modo positivo e terminante sua opinião sobre a magna questão
da mudança da capital federal, aliás prescrita no
art. 3º da Constituição brasileira. Caso não
fosse julgada digna de ser realizada, o que pessoalmente considero
como altamente prejudicial para os interesses mais vitais do Brasil,
melhor será abandonar de vez a idéia; caso, porém,
os membros do Congresso a considerassem merecedora de realização,
torna-se indispensável conceder-se anualmente a verba necessária
para o custeio dos estudos.
Eis, sr. Ministro, as ligeiras ponderações que me
pareceram dignas de serem submetidas à vossa consideração.
Saúde e Fraternidade
Ao sr. dr. Antonio Olyntho dos Santos Pires, digníssimo
ministro e secretário dos Negócios da Indústria,
Viação e Obras Públicas
L. Cruls,
Chefe da Comissão
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